Kranhacãrore
Em 1970, os índios Panará (Kenakore)
foram encontrados no rio Peixoto de Azevedo, na Base do Rio Peixoto de Azevedo
ao lado do Parque Xingu. Naquela época, os Panará eram conhecidos como
Kenakore, os índios Gigantes. Neste período, vivíamos a era da ditadura no
campo e na cidade, a oposição ao Regime Militar era perseguida com exílio,
censura e morte. Na Selva não era diferente, aos povos indígenas restaram o
desterro e extermínio.
Em 2012, o governo Federal nomeou um
grupo de juristas e professores incumbidos de integrar a chamada comissão da
verdade. Tal comissão tem por objetivo realizar investigações sobre os vários
crimes cometidos pelo Estado brasileiro entre 1937 e 1985. Há interesse
especial em buscar os crimes que aconteceram nos dois regimes da ditadura desse
período. Não obstante, é como se ignorassem os fatos relevantes ocorridos
contra os povos indígenas nesta fase, que não se encontram nas páginas das tais
comissões. Não se pode esconder das futuras gerações que os meios políticos
sociais e jurídicos em nenhum momento cobraram da justiça a total transparência
dos crimes abusos de apropriações indevidas de terras das comunidades
indígenas. As páginas da história, com certeza, anotam, de forma constrangida,
a lacuna no que se refere ao direito ao livre-arbítrio, direito a livre
expressão e o direito à propriedade. Porém, no caso dos Krenhacãrore ou Panará,
como são conhecidos, todos os seus direitos foram subtraídos.
Quando Orlando e Claudio Villas Boas
chegaram ao Xingu delineando uma linha em direção a Manaus, passando pelo Rio
Araguaia, Rio das Matas, Serra do Roncador, Xingú, Serra do Cachimbo até
Manaus, constataram que se tratava de uma área densamente povoada por índios,
18 aldeias falando nove línguas diferentes. Havia conflito entre eles, mas a
paz foi estabelecida pelos irmãos Villas Boas, com a velha técnica dos
portugueses de presentes e “ensinamentos”.
O Varal de Presentes.
Pero Lopes, irmão de Martin Afonso,
relatou que os índios mostravam-se amistosos e se sentiam muito atraídos pelos
objetos oferecidos pelos colonizadores portugueses isto aconteceu em 1500. Os
irmãos Villas Boas usaram da mesma estratégia penduravam em um varal. (Facas,
colares, panela de alumínio e machados). A preocupação dos Irmãos Villas Boas é
de manter os Kranhacãrore longe da estrada, pois já havia 2 mil homens querendo
entrar no Rio Peixoto de Azevedo, pois já se sabia que o rio era rico em
diamantes na cabeceira e ouro na foz. Por isso a expedição contava com 32
Índios impedindo a passagem dos Kranhacãrore (Panarás). Claudio Villas Boas
conta as características deste encontro, foram várias tentativas de
aproximação, mesmo ao menor gesto, os índios ameaçavam com suas flechas. Ele
usou um artificio fingindo que seu pé havia machucado e deu certo, pois os
índios se aproximaram, dai então se estabeleceu o contato. Claudio Villas Boa diz:
“[...] foi o dia mais Bonito na Pacificação. Ele atravessou o rio sozinho.”
Os primeiros contatos com índios
Gigantes ou Kranhacãrore (Panará)
Em 1974, quando os irmãos Villas Boas
estavam organizando a “conquista” dos índios Chukaramain, que usam potoque de
madeira nos lábios, encontraram entre eles os índios Kranhacãrore. Tinham como
prisioneiro um Kranhacãrore que media 2,07 de altura e constataram depois que,
entre os Kranhacãrore, havia mais seis homens com a mesma estatura, originando
assim a alcunha dos índios gigantes pela impressa.
Em 1970, durante o mandato do
presidente Médici, o governo brasileiro fez uma promessa de construir 15 mil
quilômetros de rodovias na região amazônica, dos quais 3.300 km pertenceriam a
BR 230, ou rodovia Transamazônica. Tal projeto fazia parte do Plano de
Integração Nacional (PNI), instituído pelo Decreto-lei número 1.106 em 16 de
junho de 1970.
O General Gerônimo Bandeira de Melo
reinou por quatro anos com mão de ferro na presidência da FUNAI, com a máxima:
“O Índio não pode impedir a passagem do progresso e do desenvolvimento.” Uma de
suas primeiras providências foi facilitar a construção da BR 080, cortando o
Parque Xingu, mutilando e agredindo a política protecionista do índio
estabelecida pelos irmãos Villas Boas.
Depois da pacificação, os irmãos
Villas boas retornaram para o Xingu. Foi convocado o sertanista Apoena
Meirelles, que terminou a pacificação. Nas palavras de Meirelles: ”Nossa grande
dívida para com os índios é que nós não aprendemos o que fazer com eles depois
do contato”. A situação piorou, os índios começavam a frequentar a estrada, o
que acarretava muitas más consequências. Podemos imaginar um acampamento com
1500 homens convivendo com um grupo indígena totalmente ingênuo. Atraídos por
novos sabores, adoeceram. Certa vez, roubaram açúcar de uma unidade militar. Os
índios começaram a ficar doentes, em um período de somente 3 anos, os
Kranhacãrore já tinham perdido mais da metade da população, perambulavam pelas
estradas por ironia do destino, por cima de uma das terras mais ricas do País,
mendigavam, sofriam os mais variados abusos e morriam. A Estrela Cadente de
Mentira (como eles conheciam o avião), que trazia o homem branco, trouxe outra
novidade: “a miséria”.
Tal como aconteceu com os irmãos Villas
Boas e Meirelles, a verba acabou. Tempos depois, foi convocado outro sertanista
Fiorello Praise, requisitado pelo General Ismarth. Praíse, tinha opção de
analisar uma possível transferência da tribo Kranhacãrore. A primeira
providência foi a recuperação da saúde dos índios, pois todos estavam doentes.
Nas palavras do cacique Akã dos
Panará: “Os cadáveres apodreciam a céu aberto, estávamos doentes, com tosse,
gripe, meu povo ia morrer”. Os irmãos Villas Boas, em sintonia com o Pres. Da
FUNAI, concordaram com a transferência dos Panarás para o Parque do Xingu.
Nem tudo são trevas. Na época da
ditadura, temos que reconhecer os esforços e ações do General Ismarth Araújo de
Oliveira, Ex-presidente da FUNAI. Nas palavras dele: “o estatuto do índio diz
que qualquer remoção do grupo indígena de optar de origem para outra Área tem
que ter ser mediante ato do Presidente da República. Diante desta burocracia,
optei por uma ação arbitrária, sim, a transferência imediata dos Panarás para o
Território do Xingu, afim de impedir a sua completa extinção”.
A tribo kerenhankore contava com mais
de 220 índios e restavam aproximadamente 90. Finalmente, em 11 de janeiro de
1975, os aviões da FAB transferiram para o Parque do Xingu os 79 sobreviventes
da Tribo Kerenhakore os Panarás, conhecidos como os Índios Gigantes do primeiro
contato em fevereiro de 1973. Não havia mulheres grávidas, grande parte das
crianças eram órfãs e todos estavam com malária. Essa mudança não trouxe
tranquilidade para os que, agora, eram conhecidos como Índios Panará. Desde que
chegaram ao Xingu, mudaram 7 vezes em direção ao Peixoto. Sempre com vontade de
voltar para a terra boa, a terra de seus pais, longe de doenças e do
desconforto de habitar em terra alheia.
O cacique Akã descreve sua angustia:
“...Logo que chegamos morreu mais gente. Raoni me diz: vem comigo (cacique dos
Caiapós, que vivia no Xingu). Nas quatro mudanças o nosso povo quase acabou.
Akã segue dizendo ... eu não gosto do Xingu, minha terra tinha tudo o que
eu preciso e gosto. Eu tenho saudade dela, eu gosto do lugar onde nasci.”
Com a transferência, dos Panarás, a
região foi invadida por garimpeiros, madeireiros e empresa de mineração. No
lugar da antiga aldeia da Tribo Kerenhakore, está, hoje, a cidade de MATUPA MT.
Em todo o vale do Peixoto de Azevedo,
surgiram 28 cidades. No dia 1º de novembro de 1991, o grupo dos Panarás chegou
à cidade de MATUPA e fez reconhecimento de sua antiga aldeia, agora tomada pela
cidade. Por terra e pelo ar, eles viram os estragos. O garimpo e as fazendas
derrubaram as matas, poluíram e assorearam os rios. Muitos rios viraram imensos
lamaçais. O cacique Akã ficou horrorizado. A paisagem desoladora confirmou o
que o cacique Akã ouvira na infância “Os brancos comeram a terra”.
Sobrevoando rumo ao norte de suas
Terras, o chefe Akã e seus companheiros avistaram que uma parte de seu
território havia sido preservada, o que causou grande alvoroço entre os Panarás
e que ocasionou o fim do processo de seu desterro. Um pequeno grupo dos Panarás
refez o trajeto de volta a sua terra e começaram os preparativos, construíram
roças, Malocas e uma pista de pouso para o tão sonhado retorno.
2 de Agosto de 1994, a comunidade
Indígena Panará entrou com uma ação declaratória contra União e a Funai e o
Instituto de Colonização e Reforma Agrária o INCRA. Eles pretendem que a
justiça reconheça o Direito dos Panará a posse e uso fruto da Área de 408 mil
hectares. 14 de dezembro de 1994 finalmente foi publicada o despacho do Pres.
FUNAI reconhecendo o direito dos Panarás a uma área comproeendida entre os
municípios de Guaratã MT. E Altamira PA.
A Lenda dos Índios gigantes se
confirmou, não pela estatura e hostilidade mas pela persistência e coragem. A
tribo finalmente retornou para parte de seu amado território, como legítimos.
Desde da época dos Colonizadores Portugueses se oferece muito pouco em defesa
dos Povos Indígenas do Brasil, naturalmente houve algum progresso por parte de
ONGs, Universidades, Direitos Humanos e o Governo, mas pelo que tiramos deles
lhe ofertamos em troca na mais que um “Varal de Presentes”.
Um ótimo texto!! Enfatiza exatamente o que passaram...bem explicado!
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